Honrando o sagrado feminino

“Shiva, cheio de agonia da separação, levantou o corpo sem vida de Sati, levou-o junto ao coração e beijou-a uma e outra vez. Lábios com Lábios, peito com peito, Shamakara abraçava o corpo de sua amada. Ele desmaiou várias vezes nesse momento, após um forte abraço em Sati, alucinado saiu correndo, louco de dor. 
Vishnu, apoiando sobre seu peito a cabeça do desvanecido Shiva, lamentou-se em voz alta e, ao término de algum tempo, animou seu amigo dizendo: Oh Shiva, recobra teus sentidos e escuta o que vou te dizer. Sem nenhuma duvida vais recuperar tua Sati, pois Shiva e Sati são inseparáveis, como o frio da água, o calor do fogo, o odor da terra e o resplendor do Sol.
Vishnu finalmente conseguiu tranquilizar Shiva que animado por suas palavras, pode ver Sati sentada ante ele embelezada por um lindo vestido de seda amarela e com seu plácido rosto iluminado por um sorriso. A dor da separação cessou nesse instante e a alma de Shiva encheu-se de alegria ao escutar as palavras de Sati: “Seja forte \, Mahadeva, Senhor de minha alma. Em qualquer estado que meu ser se encontre, nunca estarei separada de ti…agora irei renascer como a filha de Himavat, o senhor das montanhas, para converter-me de novo em sua esposa.”

Na cosmologia tântrica, todo o universo é percebido como sendo criado, penetrado e sustentado por duas forças fundamentais, que estão permanentemente em uma união perfeita e indestrutível. Estas forças ou aspectos universais são chamados de Shiva e Shakti. Shakti é a fonte de poder e dinamismo por trás da estabilidade de Shiva. Shiva não existe sem Shakti, assim como na mitologia, sem a deusa Shiva perde seus sentidos….O yoga tântrico busca a integração das energias do masculino e feminino em cada ser.

Há um poder que se esconde debaixo das nossas pálpebras que nos torna capazes de não só olhar mas ver além das aparências. Um  estranho mecanismo que nos torna capazes de, pelo nosso olhar transformar toda a nossa postura perante o feminino sagrado, e perante o mundo no qual vivemos.

Para a mulher apaixonada, independente do homem não ser belo, nem esperto, nem jovem….nem rico…enquanto todos pensam. “Como ela pode gostar dele?” Para ela, ele é o homem ideal, o tântrico diria: “Ele encarna Shiva.”
Na ótica do Tantra, a mulher enamorada percebe a realidade última para lá da forma física, e assim também é o homem enamorado, que vê ela uma Deusa, sua Shakti.
Estamos constantemente com os olhos encobertos, confundimos o superficial, com o profundo, o verdadeiro, oculto sob as aparências. Fisicamente o corpo real mascara o corpo verdadeiro.
Com isso, as mulheres sofrem constantemente uma invasão pelos olhos do homem comum. O homem comum não consegue olhar para ELA como a personificação da Deusa, portanto direciona seu olhar a mulher de forma sexual, desejando-a como se deseja um objeto.
Esse olhar também é vitima de um masculino distorcido,  o homem, também está tão violentado quanto o feminino, quanto a mulher. A ele lhe conferiram a força bruta, a ação, o machismo, e isso tem feito do homem um ser mutilado.
Na semana do Navaratri, festival onde honramos as diversas formas femininas de Deus, num culto ao feminino, acreditamos que o Masculino Sagrado caminha lado a lado com o Feminino Sagrado. Isso gera relações mais harmoniosas, amorosas e cooperativas, pois todos se respeitam independente de gêneros e dividem as atividades cotidianas de acordo com as habilidades e vontades de cada um.
Dedico esse texto ao meu parceiro, meu Shiva, que pela admiração e respeito ao feminino, me ensina cada dia mais a mudar meu olhar sobre mim mesma e para o masculino.
Se todos nós compreendêssemos que é de suma importância mudar a forma com que se olha o outro, possivelmente teríamos um mundo sem tantos casos de violência. Digo isso também para a forma como a mulher vê uma outra mulher, têm tanta mulher com olhar distorcido, com um olhar carregado de inveja, de competição, de comparação….
Portanto para mudar o lado de fora, antes precisamos mudar o que esta preso dentro…

Todas as vezes que caminharmos, que andarmos por ai, busquemos olhar o Sagrado de cada um.

Olhar nos olhos, numa postura doce e delicada.
Olhar nos olhos, perceber a energia, sentir a vibração. Não olhar com agressividade, com inveja, com comparação. Cuidar para que nosso olhar não seja vulgar…
Olhar além dos olhos. Olhar com olhos vestidos de doçura, que transbordam nossa melhor verdade.
Olhar o mundo com o coração. Olhar os outros com o coração. Que tenhamos para a vida, o nosso melhor olhar.
O olhar sincero vem do coração, é como escolhemos ver o mundo, ver as pessoas, ver o divino em cada um.

Jay Ma!!
Namaste
Namaskar